Ursula Rösele
Quarentena em devaneio – vinte e dois deles
#22
Um sinal
A matéria mesma de um sonho idílico. Película, tinta, todo um painel repleto de flores brancas, rosas e azuis. Passou as mãos ali, seus olhos ainda fechados. Sentiu as pétalas, deixou de temer que houvesse pequenos espinhos escondidos
Italianidades
Pisou nas ruínas, sentiu o tempo histórico com seus pés. Sorriu, lembrou de todos os filmes vistos, do idioma cantado e o complemento de linguagem no movimento passional das mãos
Gelato, fontes, gosto de azeitona. Brilho da chuva de ontem nas ruas
Igualmente o cheiro
Escombros e figuras saídas de sua imaginação
Era tempo já
Chianti, Barolo, Valpolicella
Tocou a taça em seus lábios e sentiu o barulho da uva, crocante, mordida direto do pé
Afastou cada instante reflexivo que lhe forçava recuar
Era ali agora
Sempre
Depois também
Vida resto
Sentar, em uma varanda repleta de plantas
Os pés tocando uma das reentrâncias da faixada
Caderno no colo, caneta em mãos
Velha guarda
Enquanto bebia o vinho, deixava jorrar azeite no pão
Escrevia seus novos poemas babosos
Evocava o cheiro do mar nos olhos derramados de luz
Por vezes subia a barra da saia
Ajeitando o calor do fim do dia
No vinil, Un Grande Amore E Niente Più, de Peppino di Capri
E se ria
Toda
Os ombros chegavam a vibrar o dorso cabal
A curva da face em galhofa
Quão besta podiam ser seus desejos
Um sorriso ao sol que se punha
Lá
Avante
Acorde
Perpetuidade
Ursula Rösele – 18/11/20