Ursula Rösele
Sábado
Espaços, é o que me vêm
Eles sobravam ao meu redor
Filha única, pai e mães pouco convencionais
Na maioria das vezes era eu e os espaços
Janelas grandes, uma decoração medieval na sala, contrastando com as árvores, flores e o clima tropical ecoado das grandes janelas
O aparelho de vinil da Gradiente, as caixas compridas e pretas, eu pequena e magrela
Meu pai trazia fatias de pão alemão com requeijão, cortadas em quadrados simétricos
Nos vinis coloridos tocavam histórias
Smurfs, Turma da Mônica, A baleia cantora
Se bobear, minha escrita ali já habitava
Vez ou outra passeava os pés pelo tapete laranja felpudo
O fora sempre pareceu convidativo
Lembro do céu azul e do silêncio
Foram vários apartamentos
Rua Tavares Bastos, o outro prédio, da varanda verde, Rua Universo, íngreme de doer os joelhos
Dentro, meu mundo era imenso
Bonecas, autorama, aquela bicicleta preta e azul ainda com rodinhas, a pequena lanterna debaixo do cobertor à noite
Os espaços não me pareciam opressores, mas carentes de preenchimento
Vejo hoje que os deixei abrigarem meus sonhos
Setembro, 2019
*escrito na Oficina de escrita Diários e Infância, ministrado por Carolina Fenati